Fábula sobre o Padre, Deus, Satã e o Louco
“Vê Satã, estamos próximos ao fim de nosso jogo. Da antiga energia do homem hoje só resta a debilidade. Perdido estará o nosso reino com o homem aniquilado”.
“Deus, traze-me a palavra que carrego comigo. Seduzido pode ser o homem por meus prazeres, mas levo para a toca uma presa com gosto de merda. Como devolver o brilho a esse macaco”?
“Cortemos o vínculo que prende o homem a nós. Deixemos o rebanho engordar em outros pastos. Quando pleno de saúde, voltará a nos procurar, pois essa é a sua natureza de malogro”.
Então Deus e Satã devolveram ao homem a liberdade. A maior das algemas, o Capital, fora destruída a golpes divinos e infernais. O homem retornou a ser bárbaro e pagão, dando fim à civilização. Em declínio entrou o mundo de Deus e Satã, e uma nova reunião fora conclamada:“Observa Satã, o homem voltou a dançar com os animais. Chamemos o nosso maior representante, o Padre, antes que nos leve à morte o esquecimento do homem”.
“Que semeei culpa e ganância, novos impérios e igrejas sejam construídos. Tenho sede de crianças, virgens e guerreiros”.
Ao ritual pagão fora enviado o Padre. Em meio à orgia, o Padre caminhava, se benzendo a cada gozo de homem e mulher. Subiu a um platô próximo e chamou a atenção dos homens para si, pois tinha o Padre o dom da oratória:
“Escuta homens. Triste conosco está o Criador. Existimos da sua carne, mas nos banhamos no mar do pecado. Sofre nosso Deus com o vazio desta vida. Devemos nos amar, e à sua semelhança, pelo mundo devemos construir”.
O Padre tratou de mostrar ao homem como proceder, e lembrou os seus atos levianos. De vergonha choravam as mulheres, e os homens discutiam como agir. O Padre regia como maestro os novos planos da humanidade.
Mas um homem desta tribo não entendia as palavras do Padre. Seu nome era Louco, e era conhecido por seu afeto pela espada. Do desentendimento sobreveio a ira, e certa noite, enquanto para centenas discursava o Padre, o Louco veio por suas costas, e desferiu-lhe um potente golpe no pescoço, fazendo rolar a cabeça do Padre pelo ar.
Daquele ato monstruoso a multidão despertou do transe. Desconfiaram de que um jogo fazia o Padre, pois não se fazia a troco de nada um pedido de mudança. Colocaram numa empala a cabeça do Padre, e nas festas costumavam lhe atirar pedras e sacos de fezes. Com o homem distante, Deus e Satã definharam de fome.
E sem o Padre, Deus e Satã, a fábula não poderia ter final ruim. Aníbal Lemos – 11/11/07.
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